A proposta do governo federal que modifica o Imposto de Renda traz diversas mudanças para investidores, de modo a simplificar a tributação e aproximá-la da de outros países.
De acordo com o projeto apresentado pelo Ministério da Economia, os dividendos distribuídos por empresas a seus acionistas, hoje isentos de IR, passam a ser tributados em 20% na fonte. Há uma exceção de até R$ 20 mil por mês em dividendos para microempresas e empresas de pequeno porte (as que têm faturamento anual de até R$ 360 mil e R$ 4,8 milhões, respectivamente).
Já os JCP (juros sobre capital próprio), hoje tributados em 15% na fonte para os investidores, deixariam de existir.
Hoje, eles são computados como despesas pelas empresas, antes do cálculo do lucro líquido, não sendo tributados pela CSLL (Contribuição Social sobre Lucro Líquido). É uma forma da companhia pagar menos impostos, já que as empresas de capital aberto são obrigadas a distribuir no mínimo 25% do seu lucro aos acionistas.
A distribuição de proventos de FIIs (Fundos de Investimento Imobiliário), hoje isenta para fundos com mais de 50 cotistas, ou seja, os disponíveis para qualquer investidor, também passaria a ser tributada, com alíquota de 15% na fonte.
Dividendos isentos e o uso de JCP foram adotados nos anos 1990 como incentivo para as companhias de capital aberto e para o mercado de renda variável. O mesmo aconteceu com os FIIs, que eram um suporte ao mercado imobiliário.
Segundo defensores do projeto, o mercado se desenvolveu muito desde então, o que deixaria os incentivos fiscais menos necessários, em um contexto em que as contas públicas se deterioram rapidamente.
“O governo disse que manteria benefícios para os setores imobiliário e do agronegócio, importantes para a criação de emprego, mas, taxando os FII, reduzem o financiamento de um setor”, diz Ana Cláudia Akie Utumi, sócia-fundadora de Utumi Advogados.
Ela aponta que há dúvidas sobre outros dois instrumentos de financiamento destes setores, a LCI (Letra de Crédito Imobiliário) e a LCA (Letra de Crédito do Agronegócio), que hoje são isentos de IR. “No projeto apresentado não está claro como ficam, é possível que percam a isenção”, diz Ana Cláudia.
Ainda se discutia uma possível tributação dos também isentos CRI (Certificados de Recebíveis Imobiliários) e CRA (Certificados de Recebíveis do Agronegócio), mas eles ficaram de fora do projeto.
Especialistas apontam que as alíquotas propostas pelo governo devem sofrer alterações. O mercado aposta em uma taxa de 15% para dividendos, correspondente à cobrança atual sobre os JCP.
“O governo passou com uma gordura mesmo. A única certeza que eu tenho é que não é da forma que foi apresentado que [o projeto] vai passar”, diz Victor Hasegawa, gestor de ações da Infinity Asset.
Ele diz que uma forma que as empresas têm de contornar o fim do JCP e o IR sobre dividendos é remunerar o acionista por meio de recompra de ações. Ao adquirir os papéis em circulação e cancelá-los, a empresa concentra o capital e aumenta o valor das ações restantes, fazendo com que os papéis detidos pelos investidores valham mais.
“A empresa também pode remunerar os investidores reinvestindo em si, crescendo, e gerando mais lucro”, diz Hasegawa.
Além disso, o governo propôs a redução da alíquota do IR de empresas dos atuais 15% para 10%, o que também pode ampliar o lucro. De acordo com especialistas, porém, a tributação sobre dividendos pode fazer com que as empresas paguem mais impostos no total do que pagam hoje, mesmo com um IR menor.
Outra mudança para os investidores é no day trade (compra e venda da ação no mesmo dia) e na venda de cotas de FIIs. Estas operações são tributadas em 20%, mas, segundo a proposta, serão tributadas em 15%, como o swing trade (as compras e vendas de ações em dias alternados).
Hoje, é preciso pagar o IR sobre estas operações mensalmente por Darf (documento de arrecadação de receitas federais) caso a venda de papéis no período supere R$ 20 mil. Abaixo deste valor, o lucro é isento de imposto, mas ainda deve ser declarado.
Para calcular o lucro mensal, contabilizando os lucros e prejuízos de cada operação, se separa o day trade do swing trade atualmente. O plano do governo é unificar as duas operações neste cálculo.
O governo também pretende mudar a tributação de mensal para trimestral, elevando a isenção para uma soma de vendas até R$ 60 mil no período.
“Resolveram simplificar e juntaram o day trade com outras operações, mas a sistemática de apuração de ganhos e perdas fica a mesma. Ao invés de fazer uma conta mensal, faço trimestral. E não são mais doze contas no ano, e sim quatro", diz Ana Cláudia.
Caso o investidor esqueça de recolher o IR sobre renda variável mensal, que tem o prazo de pagamento até o último dia útil do mês seguinte ao da apuração do lucro, há multa e juros.
A multa é de 0,33% por dia de atraso, limitado a 20% e um juro, que consiste na soma da taxa Selic do mês seguinte àquele do vencimento do tributo até a taxa Selic do mês anterior ao que será feito o pagamento, e acrescenta-se a esta soma 1%, que é referente ao mês de pagamento.
O percentual dos juros de mora é aplicado sobre o valor do tributo ou contribuição devido. Não há cobrança para pagamentos feitos dentro do próprio mês de vencimento. Por exemplo, se o tributo vence em 21 de novembro, e, se pagar até 30 de novembro, não pagará juros de mora, apenas a multa de mora.
Segundo a proposta de mudança tributária do governo, o IR para renda fixa também mudaria, com produtos como Tesouro Direto e CDB, com alíquota única de 15%. Atualmente há um escalonamento em função da duração da aplicação: 22,5% até 180 dias; 20% de 181 a 360 dias; 17,5% de 360 a 720 dias e 15% em resgates após 720 dias, de modo a incentivar investimentos de longo prazo.
Fundos que também seguem a tabela regressiva —renda fixa, multimercados, crédito privado, cambiais e ouro— terão alíquota única de 15% em todo novembro (come-cotas) ou no resgate, se igualando ao IR sobre fundos de ações e ETFs (fundos de índice) de ações, que têm IR de 15% no resgate.
Assim, acabaria o come-cotas de fundos em maio. O come-cotas é uma antecipação obrigatória do IR que atualmente acontece uma vez por semestre, sempre nos últimos dias úteis de maio e novembro.
Nesta cobrança, o número de cotas na carteira do investidor diminui automaticamente de acordo com a menor alíquota do IR correspondente (no caso dos fundos de curto prazo, 20% e nos de longo prazo, 15%).