Os meses de março e abril, os primeiros sob o impacto no novo coronavírus, marcaram um novo momento nas negociações de acordos entre empresas e empregados.
As discussões para reajustes salariais praticamente desapareceram e deram lugar às negociações para reduzir jornada e salário, segundo o Salariômetro, levantamento feito pela Fipe (Fundação Instituto de Pesquisas Econômicas).
Do total de 1.154 acordos e convenções coletivas negociados em março e abril, somente 3% resultaram em reajuste salarial, seja ele acima da inflação em 12 meses, ou apenas com a reposição do INPC (Índice Nacional de Preços ao Consumidor) calculado pelo IBGE.
O professor da USP (Universidade de São Paulo) Hélio Zylberstajn, coordenador do Salariômetro, calcula que essas negociações afetem entre 300 mil e 400 mil trabalhadores formais.
Em março, o índice médio de reajuste já estava negativo em 13,6%, , impactado pelos primeiros acordos de redução de salário e jornada. Naquele mês, 51,5% das negociações resultaram em acertos com reajuste abaixo da inflação.
Agora, somadas as negociações fechadas em abril, esses números disparam –96,8% dos acordos ficaram abaixo da inflação. Com isso, o reajuste médio no período ficou negativo em 34%
Segundo o levantamento, o setor com o maior número de acordos para redução de salário e jornada e suspensão de contrato de trabalho, até o dia 19 de abril, foi a indústria. Até março, bares, restaurantes, hotéis e o comércio em geral já tinham fechado acordos para reduzir esses pagamentos.
Para o professor Hélio Zylberstajn, no primeiro mês sob a pandemia da Covid-19, os acordos foram mais volumosos em setores que precisaram parar imediatamente, como foi o caso do comércio, do setor de alimentação e alojamentos.
“Essa parada chegou também à indústria, que primeiro usou outros dispositivos, como férias, banco de horas. Agora há também um ajuste às necessidade de consumo, à queda nas encomendas de bens. O volume de acordos concentrado em São Paulo também indica um efeito da redução na indústria”, afirma.
Das 1.154 acordos e convenções coletivas negociadas em março e abril, 328 –quase 30% do total– foram em São Paulo.
Na indústria metalúrgica de todo o país foram fechados 183 negociações desde o início da crise sanitária, o equivalente a 16% do total acordado. Na sequência aparecem os setores de transporte, armazenagem e comunicações (175 acordos), comércio atacadista e varejista (143), bares, restaurantes, hotéis, diversão e turismo (137) e indústria química (69).
Essas negociações coletivas analisadas pela Fipe mostram uma predominância nos acordos por redução de salário e jornada, mas a suspensão de contrato não fica muito atrás. São 854 do primeiro tipo e 750, do segundo.
A redução de 25% apareceu em 549 negociações, a de 50%, em 530, e a de 70%, em 460.
Zylberstajn diz que em boa parte das negociações analisadas os termos finais preveem também outras condições, como o pagamento de ajuda compensatória. Esse pagamento é previsto na MP que liberou a realização de acordo individual de salário e jornada.
A vantagem, para a empresa, é que não existem encargos como INSS ou FGTS sobre esses valores, tornando-os mais baratos.
A Medida Provisória 936, de 1º de abril, facilitou a realização de acordos para cortar jornada e salário e também para suspender contratos de trabalho, e incluiu a possibilidade de, para reduções de 25%, as empresas fazerem a redução por meio de negociação individual.
Os dados coletados pelo Salariômetro da Fipe consideram os acordos e convenções coletivas registrados no Ministério do Economia. O contador de acordos do governo –que inclui negociações individuais– aponta pouco mais de 8 milhões de trabalhadores com salário reduzido.