No primeiro mês completo de isolamento social imposto pela Covid-19, 8,6 milhões de pessoas deixaram de trabalhar em empregos formais e informais, na comparação com igual período do ano passado.
Em abril houve um encolhimento inédito de 9% na população ocupada, segundo dados isolados para abril da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua (PnadC).
A Pnad Contínua, calculada pelo IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística), mede a desocupação por trimestres móveis —e havia apontado fechamento de 4,9 milhões de vagas no trimestre encerrado em abril.
Com base no dado oficial, pesquisadores do Ibre/FGV (Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getulio Vargas) estimaram a eliminação mensal de empregos na pandemia.
Em março, mês apenas parcialmente afetado pelo isolamento, a destruição de postos de trabalho havia atingido 2,3 milhões de pessoas na comparação com o mesmo período de 2019, de acordo com o Ibre.
Tanto em março quanto em abril, os principais afetados dentro da população ocupada foram os trabalhadores informais e os chamados por conta própria, geralmente os que ganham menos no mercado.
Em maio, outro mês completo de isolamento, a expectativa é que os cortes sejam aprofundados, atingindo mais severamente desta vez os empregados formais e de remuneração mais elevada.
Os trabalhadores com carteira assinada vinham sendo parcialmente protegidos por um programa do governo que permitiu a redução de jornada e salário ou suspensão temporária dos contratos —cerca de 8 milhões de trabalhadores foram incluídos no programa, segundo dados mais recentes do Ministério da Economia.
O pesquisador do Ibre/FGV Daniel Duque qualifica como dramática a inflexão no mercado de trabalho, que mostrava uma relativa melhora até fevereiro, antes de a pandemia obrigar as pessoas a ficarem em casa.
“A partir de maio e em junho, os formais é que devem ser afetados com mais força. A expectativa é que haja alguma recuperação no mercado de trabalho só no quarto trimestre”, diz Duque.
Olhando os efeitos do isolamento no trimestre terminado em abril, na comparação como os três meses encerrados em janeiro, quase todos os segmentos foram atingidos —a exceção foi a administração pública.
Outros dados do IBGE relativos ao primeiro trimestre também trouxeram resultados bastante negativos, sobretudo para os que ganham menos. Esse detalhamento de renda para o trimestre até abril só será conhecido nas próximas semanas.
Entre janeiro e março, a metade mais pobre do país perdeu 6,3% de sua renda na comparação com o último trimestre de 2019. Já os 10% mais ricos ganharam 0,8% —e os 40% “do meio”, entre a metade mais pobre e os 10% no topo, perderam 0,9%.
“Essas diferenças levaram a uma piora na distribuição de renda”, diz Marcelo Neri, diretor do FGV Social.
“Depois de crescer por 18 trimestres consecutivos e registrar uma pequena melhora no final de 2019, a desigualdade de renda no mercado de trabalho voltou a subir.”
Os dados do primeiro trimestre mostraram ainda uma importante reversão de tendência na renda das mulheres, por uma combinação de perda salarial e menor ocupação.
Após registrar ganhos sistemáticos entre 2014 e 2019, as trabalhadoras tiveram perda de 2,8% no primeiro trimestre sobre igual período de 2019. O rendimento dos homens recuou apenas 0,25%.
Em termos de aumento da pobreza, o auxílio emergencial deve servir de amortecedor.
“Será uma espécie de anestesia para a dor causada pelo mercado de trabalho”, afirma Neri. Em média, 70% da renda das famílias vêm do trabalho.
Para Duque, além de o emprego formal ter sido afetado com mais força a partir de maio, o que causará mais impacto sobre a renda, algumas atividades demorarão mais tempo para ser retomadas.
A expectativa do pesquisador é que possa levar até dois anos para que o mercado de trabalho se recupere.