A Covid-19 pode ser considerada uma doença do trabalho após uma decisão do STF (Supremo Tribunal Federal) anular trechos da medida provisória do governo Jair Bolsonaro que impedia a caracterização como ocupacional da doença provocada pelo novo coronavírus.
Ao comprovar que há responsabilidade do empregador pela contaminação pelo vírus e as repercussões que isso trouxe para a sua saúde, o trabalhador passa a contar com benefícios previdenciários mais vantajosos e até mesmo com uma possível indenização da empresa.
A questão é como reunir provas da responsabilidade da empresa. A saída é demonstrar que a exposição ao risco de contaminação foi estimulada ou ocorreu por negligência do patrão, segundo o advogado Rômulo Saraiva.
Apesar de a prova principal sobre o caráter ocupacional seja a anotação no CAT (Comunicado de Acidente de Trabalho), Saraiva explica que nem sempre será possível contar com a anotação correta no documento emitido pelo empregador.
Alternativas para obter o CAT com o registro correto da doença podem ser a emissão pelo sindicato, órgãos públicos competentes ou até mesmo por determinação judicial após realização de perícia.
Provas complementares, que podem mais facilmente ser obtidas pelo trabalhador, podem facilitar a caracterização da Covid-19 como doença ocupacional.
“Existem provas assessorias que podem se equiparar ao CAT, como emails do chefe pedindo para ir trabalhar, testemunhas, escalas de trabalho”, diz Saraiva.
“A ausência do fornecimento de EPIs [equipamentos de proteção individual] pode também indicar a responsabilidade do patrão”, diz comenta. “Fotografias e gravações em vídeo dessas situações podem ser consideradas provas.”
Um dos pontos mais importantes do reconhecimento da doença causada pelo coronavírus como ocupacional ocorre quando há sequelas e, eventualmente, a invalidez do paciente.
“A Covid, por si só, é tudo ou nada: o paciente se recupera ou morre. Mas há o casos em que o tempo de internação provoca sequelas e até a incapacidade decorrente da associação de doenças”, comenta Saraiva.
A aposentadoria por invalidez que resulta de doença do trabalho, por exemplo, tem cálculo mais vantajoso do que a que resulta de uma incapacidade sem causa ocupacional.
Enquanto a primeira é calculada sobre 100% da média salarial do trabalhador, a outra equivale a 60% da média para quem tem até 20 anos de contribuição.
Decisão
No final de abril, o STF suspendeu os artigos 29 e 31 da medida provisória 927/2020
O artigo 29 restringia as possibilidades de considerar a contaminação por Covid-19 como doença ocupacional, enquanto o 31 limitava a atuação de auditores fiscais do trabalho.
“Em função de o governo ter trazido em medida provisória regras que, inicialmente, afastam o caráter ocupacional da Covid-19, havia uma facilidade para quem quer derrubar a tese de doença do trabalho”, diz.