Receosos, preocupados e desapontados. Esses foram os adjetivos usados por um executivo para descrever o estado de espírito dos empresários que participaram nesta quinta-feira (8) de um almoço com o ministro da Economia, Paulo Guedes, em São Paulo.
O executivo ouvido pela Folha, um dos participantes do encontro que prefere manter o anonimato, disse que o ministro chegou animado ao almoço, afirmando que muitos previam uma queda no PIB (Produto Interno Bruto) de 8% em 2020, mas o recuo ficou em 4%. E que zombaram quando ele, Guedes, indicou uma “recuperação em V” para a economia brasileira, mas é o que está acontecendo, disse, o que o faz entrever uma janela de oportunidades para o Brasil no cenário pós-pandemia.
O retorno dos empresários foi cético, segundo este executivo. Ninguém acredita em crescimento com a atual proposta de tributação sobre o IRPJ (Imposto de Renda Pessoa Jurídica). A princípio, a proposta prevê uma redução gradual da alíquota, dos atuais 25% para 20% em dois anos, mantendo a taxa de 9% de CSLL (Contribuição Social sobre Lucro Líquido).
Além disso, o governo também propôs tributar em 20% os lucros e dividendos. No caso das companhias da categoria de lucro real, a alíquota subiria de 34% para cerca de 43%.
Mas o maior problema da proposta que consta no projeto de lei 2.337/2021, disse o executivo, é taxar a distribuição de lucros e dividendos das empresas e tirar o direito ao lançamento de juros sobre capital próprio (JCP). A ideia é taxar em 20% os lucros e dividendos, com uma isenção de até R$ 20 mil mensais para as micro e pequenas empresas. A proposta de reforma como está, disse, compromete investimentos e empregos.
A tributação do lucro acontece sobre a pessoa jurídica e a dos dividendos incide sobre o acionista ou quotista da empresa. Na opinião de contabilistas e advogados do setor, as mudanças no IR, entregues no final de junho por Guedes à Câmara dos Deputados, que compõem a segunda parte da reforma tributária, podem elevar os tributos pagos pelas empresas.
O empresariado não vai se animar a manter a empresa nestas condições, diz o executivo ouvido pela Folha. Na opinião dele, em vez de manter a empresa, o empresário vai preferir vender o negócio e viver de juros. Segundo ele, todo mundo se mostrou “indignado” com o fato de a proposta vir de um ministro liberal, formado pela Escola de Chicago.
Guedes, segundo ele, se mostrou receptivo às queixas e disse querer uma reforma que traga equilíbrio —caso contrário, ele está fora do governo.
Os representantes dos banqueiros na reunião reforçaram que a possibilidade de impedir o lançamento de juros sobre o capital próprio e tributar dividendos é muito ruim para o setor. Guedes, então, teria acenado com a possibilidade de uma “corporate tax” de 20%, contra a atual de 34% paga pelas companhias de lucro real.
Alguns empresários reclamaram da reforma tributária sem uma reforma administrativa ampla no governo. Sobre isso, diz o executivo, Guedes deixou claro que a administrativa só vai valer mesmo para os novos funcionários públicos, porque os atuais têm direitos adquiridos.
O ministro sugeriu que os empresários organizem, por setor, um estudo sobre os impactos econômicos das medidas e encaminhem, o mais rápido possível, os respectivos relatórios para a sua equipe técnica.
O almoço foi no apartamento do administrador do grupo de empresários Esfera Brasil, João Camargo, no Morumbi, zona oeste de São Paulo. Alguns nomes que haviam sido divulgados pelo Ministério da Economia, como Luiza Helena Trajano (Magazine Luiza), André Esteves (BTG), David Feffer (Suzano) e Flávio Rocha (Guararapes/Riachuelo), não estavam presentes.
Mas participaram Luiz Carlos Trabuco (Bradesco), Vander Giordano (Multiplan), Rafael Furlanetti (XP Investimentos), Washington Cinel (Gocil Segurança e Serviços), Jean Jereissati (Ambev), Isaac Sidney (Febraban), entre outros.
Também estiveram presentes outros nomes que não estavam na lista, como o empresário Michel Klein (da família fundadora da Casas Bahia), o banqueiro José Olympio Pereira (Credit Suisse) e o presidente da Abrasca (Associação Brasileira das Companhias Abertas) e da Cosan, Luis Henrique Guimarães. Também participou Guilherme Afif Domingos, assessor especial do Ministério da Economia.
Guedes fez questão de ressaltar ainda que o Congresso trabalha alinhado ao governo e deu como exemplos a medida provisória que permitiu a privatização da Eletrobras, o novo marco do saneamento e a proposta de venda dos Correios.
Após o almoço, Guedes recebeu empresários ligados à construção e incorporação no escritório do Ministério da Economia, na região central da capital. Lá, durante pouco mais de um hora, ouviu dos participantes que, da maneira como está o projeto de lei da reforma, ele irá fragilizar e inviabilizar investimentos no setor.
Guedes disse aos empresários que a Receita Federal —de onde veio o projeto de lei— talvez tenha errado na dosimetria das medidas e reafirmou que a reforma será neutra, ou seja, não aumentará a carga tributária, apenas redistribuirá a cobrança.
“Pedimos ao ministro equidade para que não haja mais tributos. As pessoas jurídicas já são muito taxadas”, diz Antonio Setin, da Setin Incorporadora.
Na avaliação dele, Paulo Guedes é receptivo à ideia de que, ao reduzir o IRPJ, há um incentivo para que o dinheiro fique na atividade —no lugar de virar dividendo.
Outra preocupação do setor é em relação à cobrança de Imposto de Renda sobre as SPEs (Sociedades de Propósito Específico), segundo o presidente da Abrainc (Associação Brasileira de Incorporadoras Imobiliárias), Luiz França.
A SPE é formada especificamente para determinado projeto, a fim de garantir ao comprador do imóvel que o patrimônio da incorporadora está saudável. “Ao final do projeto, a SPE envia o seu lucro para a holding”, diz França. “Se houver a cobrança de Imposto de Renda neste momento, isso vira um custo para a empresa”, diz.
A cobrança de imposto sobre os lucros de uma SPE não está especificado no projeto de lei, mas a redação dá margem a essa interpretação.
"Mas o ministro defendeu a redução da carga tributária para as empresas e pediu ao setor um estudo técnico sobre o impacto das propostas apresentadas pelo governo, o que vamos providenciar", afirmou.
Setin disse que o ministro também sinalizou favoravelmente pela revisão da tributação de fundos imobiliários. “Ele entende que é possível estipular um patamar mínimo para não pegar o pequeno investidor."
Pelo projeto, a renda proveniente dos FII (Fundos de Investimento Imobiliário), hoje isenta de IR, passaria a ser tributada na fonte em 15%.
Segundo empresários que estiveram no encontro, havia muita apreensão antes da reunião. A conversa com o ministro da Economia teria conseguido acalmar os ânimos.
Basílio Jafet, presidente do Secovi-SP (sindicato da habitação), diz que Guedes assegurou que a reforma não vai desorganizar o sistema tributário, tampouco complicar a situação dos empresários, e ressaltou que é necessário aproveitar a janela atual para a aprovação do texto.
O ano que vem, com eleições em outubro, é considerado um período desfavorável a discussões complexas e importantes, uma vez que os parlamentares tendem a dar mais atenção às bases e ficam mais expostos a cobranças.