A Câmara dos Deputados aprovou no fim da noite desta terça-feira a medida provisória 881, conhecida como MP da Liberdade Econômica . Foram 345 votos a favor, 76 contrários e uma abstenção.
Nesta quarta-feira, os deputados precisarão analisar os destaques. Isto é, as propostas de mudanças no texto indicadas pelos partidos. Só então a matéria pode seguir para o Senado , que tem até o dia 27 de agosto para votá-la.
Uma das principais bandeiras do governo Bolsonaro para desburocratizar o ambiente de negócios do país, a medida prevê facilitar a abertura e o fechamento de empresas e diminuir restrições aos horários de funcionamento de diversas atividades econômicas, entre outras medidas.
Segundo o governo, as mudanças têm potencial de gerar 3,7 milhões de empregos numa década. Para a oposição, no entanto, foi embutida no texto uma espécie de “minirreforma trabalhista”.
Para que a medida começasse a ser votada ainda nesta semana e não perdesse a validade, o governo aceitou enxugar o relatório do MP. O texto analisado pelo plenário da Câmara ficou muito parecido com a versão enviada pelo Palácio do Planalto ao Congresso ainda em abril.
O relatório do deputado Jerônimo Goergen (PP-RS), aprovado na comissão especial que discutiu o texto em julho, havia ampliado o alcance da medida, depois de receber cerca de 300 emendas, entre elas alguns jabutis (itens que não têm relação direta com o assunto da matéria).
Uma das preocupações do presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), era que, caso o texto aprovado em comissão fosse mantido, a MP acabasse sendo questionada no Supremo Tribunal Federal (STF). Cerca de 30 artigos foram retirados do texto da comissão.
Pontos de resistência
A resistência entre os parlamentares - e também entre associações de classe - se concentrou nas proposições que tocavam diretamente a legislação trabalhista em vigor. Com risco de derrota ou de o texto sequer ser votado, o governo se mobilizou: se reuniu com parlamentares no Ministério da Economia para fazer um pente-fino na proposta , e eliminar todo e qualquer ponto que pudesse travar a votação, principalmente por potenciais controvérsias constitucionais.
A MP original, encaminhada no fim de abril, tinha 19 artigos e avançava pouco sobre as questões trabalhistas. O relatório da comissão, porém, trouxe alterações nessa seara. Isso tumultuou as discussões e gerou forte resistência na oposição - e até entre deputados que haviam se posicionado a favor de outros pontos do texto.
Na avaliação do relator da proposta, deputado Jerônimo Goergen, os pontos essenciais da medida provisória foram preservados. E o que poderia gerar controvérsia voltará a ser discutido em projetos de lei específicos.
O texto que começou a ser discutido no Plenário nesta terça autoriza o trabalho aos domingos e feriados , desde que o empregador compense o empregado com uma folga ao longo da semana. Pelo menos uma folga dominical deverá ser dada a cada quatro semanas. O texto chegou a prever um período de sete semanas para a folga dominical obrigatória, mas o governo recuou diante da resistência da oposição e de algumas categorias sindicais.
Já o artigo que previa a criação de um documento único e eletrônico para transporte de cargas foi retirado. Mais cedo, associações de classe de caminhoneiros se manifestaram a favor da MP, mas contra o chamado Documento de Transporte Eletrônico (DT-e), que passaria a ser de emissão obrigatória para todos os modais de transporte.
Segundo a Confederação Nacional de Transportes (CNT), a inovação só burocratizaria ainda mais o trabalho das empresas de transporte, por se tratar de um novo documento fiscal a ser emitido, sem que haja, ainda, nada que unifique a documentação hoje estabelecida.
Diante da pressão, o governo cedeu. Agora, fica a cargo do ministério da Infraestrutura negociar com a categoria os temos da criação de um novo documento para a atividade e enviar à Câmara um projeto de lei que regulamente o tema.
A pressão dos aeroviários também teve efeito. O relator retirou do texto o artigo que previa regras diferenciadas para quem recebe mais que trinta salários mínimos. Pela proposta anterior, esses contratos de trabalho passariam a ser regidos pelo Direito Civil, e não mais pela CLT.
- O apelo final veio dos pilotos da aviação, que me trouxeram a demanda, uma preocupação pelo que vive o setor aéreo nesse momento, especialmente em relação a uma das empresas, que tem um problema mais grave, e poderia trazer prejuízo a milhares de trabalhadores. E como não tinha segurança (a respeito) da constitucionalidade (da lei), não haveria porque forçarmos a barra, afirmou Goergen.
A MP dispensa o trabalhador de bater ponto, e prevê acordo individual entre empregador e empregado, o que dificulta o registro de horas exatas.
Pontos caros ao governo seguem na proposta, como o fim do E-social, plataforma que reúne informações trabalhistas, previdenciárias e fiscais das empresas. Ela será substituída por um sistema mais simples, que demandará dos empregadores um volume de informações 50% menor a serem preenchidas.
A dispensa de licenças prévias e alvarás para negócios considerados de baixo risco, como bares e cabeleireiros, foi mantida. Em junho, o governo já havia autorizado, por meio de portaria do ministério da Economia, que 287 categorias de pequenos e médios negócios fossem dispensados dessa obrigação.
A carteira de trabalho digital segue na proposta. A versão impressa do documento será autorizada em casos de exceção, como, por exemplo, em locais em que os trabalhadores tenham alguma dificuldade de acesso aos meios digitais. Em ambos os casos, o número do CPF valerá como número de identificação do trabalhador.
Veja as mudanças previstas na MP
Trabalho aos domingos
Fica liberado o trabalho aos domingos e feriados. Mas ele deverá ser pago em dobro ou compensado com folgas. Ao menos uma delas deve ser dada no domingo a cada quatro domingos trabalhados.
Ponto por exceção
O modelo permite que um funcionário de qualquer empresa possa fazer acordo individual com empregador e, com isso, cumprir todo o expediente sem fazer os registros de entrada, saída e almoço. Somente exceções serão obrigatoriamente anotadas. Entre elas estão horas extras, folgas, faltas e férias. A MP também estabelece que a obrigatoriedade de controle de ponto será para as empresas com mais de 20 funcionários. Esse ponto altera a CLT, que obriga empresas com mais de dez funcionários a ter um registro de horas de trabalho e controle de jornada.
Carteira de trabalho
Será criada a carteira de trabalho digital, mas a CTPS impressa vale em casos de exceção, como dificuldade de acesso a meios digitais pelo trabalhador. A identificação do trabalhador passa a ocorrer por meio do número do CPF.
Fim do e-Social
A plataforma, que reúne informações trabalhistas, previdenciárias e fiscais das empresas, dará lugar a um sistema mais simples, que exigirá 50% menos dados.
Sem alvará
Pequenas e médias empresas com atividades de baixo risco, como cabeleireiros e bares, ficam isentas de licença prévia para operar.
Alvará automático
Caso a decisão do órgão público não seja dada no período estipulado, a concessão será automática.
Fiscalização a posteriori
Atividades de baixo risco não serão fiscalizadas por antecipação. No entanto, a visita fiscal ocorrerá se houver denúncia às autoridades.
Abuso de poder
O Estado não pode criar reserva de mercado ao favorecer algum grupo econômico ou profissional nem redigir enunciados que impeçam a entrada de novos competidores no mercado, sejam eles nacionais ou estrangeiros.
Sociedades empresariais
Segundo as regras, o governo não poderá criar limites à formação de sociedades empresariais e à de atividades econômicas. Uma sociedade limitada poderá ser criada, inclusive, por uma só pessoa.
Fundos de investimento
Em caso de prejuízo financeiro de terceiros, a responsabilidade de cada investidor fica limitada ao valor de suas cotas.
Patrimônio protegido
Somente o patrimônio social de uma empresa pode responder pelas dívidas da companhia, e isso não se confundirá com o patrimônio da pessoa física titular da empresa.
Teste liberado
As empresas não precisarão mais de autorização do governo para testar produtos e serviços, se houver consentimento de quem for testá-los, a menos que haja risco à segurança pública ou nacional.
Digitalização
Fica permitido às empresas e empreendedores arquivar qualquer documento em microfilme ou por meio digital, e ele estará equiparado ao documento físico para todos os efeitos legais.
Vistoria educativa
A primeira vistoria feita pelo poder público a um estabelecimento não será punitiva — à exceção de circunstâncias em que algum dano significativo tenha sido provocado pelo negócio.