Com o distanciamento social, marcas que já atuavam em diferentes canais de venda tiveram mais facilidade para chegar até o cliente.
Mas, antes de se preocupar em estar em todas as plataformas, o empresário precisa avaliar se tem estrutura para gerenciá-las e integrá-las à sua operação. Esse processo pode ser gradual e precisa levar em conta a realidade de cada empreendedor.
Acostumado a transitar entre o online e o físico, o Ateliê de Calças precisou de pouco tempo para se reinventar quando a pandemia fechou suas duas lojas, nos Jardins e no shopping Pátio Higienópolis, em São Paulo.
“Quando todo o mundo se viu obrigado a usar o digital, a gente já tinha canais estabelecidos que podiam reverter para vendas”, afirma Liana Pandim, 34, dona.
“Parece simples comprar um telefone com WhatsApp e começar a trabalhar, mas é preciso ter processos bem definidos e ferramentas conectadas para as vendas não se perderem”, completa.
Apesar de pequeno, o negócio consegue colocar em prática estratégias omnichannel, ou seja, ter à disposição do cliente canais integrados de atendimento, garantindo uma experiência parecida na loja física e no online.
Na prática, isso significa que quem faz uma compra no Ateliê de Calças pode entrar em contato por WhatApp para tirar uma dúvida, finalizar o pedido com um link recebido no próprio aplicativo de mensagens ou, se quiser, comprar mais tarde pelo ecommerce —o inverso, experimentar na loja e receber em casa, também é possível.
Se quiser trocar a peça, o cliente pode ir até uma unidade, onde o vendedor tem acesso ao seu histórico de compras, já que a base de informações de todos os canais é unificada.
Em geral, a operação omnichannel é associada a grandes marcas, que fazem investimentos robustos em estratégias para cada canal, análise de dados e de estoque.
“A ideia também pode ser viável para pequenas empresas, talvez não em níveis tão sofisticados, e sem meter os pés pelas mãos, crescendo aos poucos”, diz Roberto Falcão, professor de marketing da Fecap (Fundação Escola de Comércio Álvares Penteado).
Integrar os canais foi um plano executado ao longo de sete anos, diz Liana. Uma das estratégias foi pesquisar ferramentas usadas por outros empresários —e começar uma conversa com eles.
“No meio do empreendedorismo, as pessoas se ajudam porque a batalha é muito difícil”, diz Guilherme Stamm, 34, sócio e marido de Liana.
Com tantas formas de alcançar o consumidor, incluindo o Telegram, o TikTok e até o Linkedin, o empreendedor não deve se sentir pressionado a atuar em todas as frentes.
O importante é conseguir oferecer uma boa experiência na plataforma mais adequada ao público e ao tamanho do negócio. Outra recomendação é manter a constância e a agilidade na hora de responder os consumidores.
“Não adianta fazer posts nas redes sociais por duas semanas e parar. Se as pessoas veem que você não tem conteúdo, vão deixar de te seguir”, diz Roberto Falcão, da Fecap. Clientes sem resposta no WhatsApp também podem se frustrar e desistir da compra.
Para começar a aplicar estratégias omnichannel, não é necessário ter recursos financeiros ou uma estrutura administrativa que permita que você aplique o ideal, afirma Rubens Massa, professor do centro de empreendedorismo e novos negócios da FGV (Fundação Getulio Vargas).
“O importante é usar os recursos que você já tem na mão para agir, pensando em estratégias que sejam fáceis de executar”, afirma ele.
A padeira Valéria Rezze, 58, escolheu entrar no Instagram para conquistar novos fregueses durante a pandemia. Ela inaugurou a Santa Augusta Pães Artesanais em abril e, com isso, teve que postergar os planos de servir os clientes nas mesas da padaria.
Para não depender do movimento de pedestres que passam em frente a sua vitrine, no bairro de Santa Cecília (região central de São Paulo), Valéria anuncia os tipos de pães que serão produzidos naquele dia em sua conta na rede social.
A cada 40 minutos, mais ou menos, ela interrompe o trabalho na cozinha para checar se recebeu pedidos e responder mensagens.
“Acho muito chato deixar o cliente esperando. Se alguém perguntar algo às 10h e a resposta vier às 16h, a pessoa já perdeu o interesse”, diz.
O número de pães vendidos por dia (cada um custa, em média, R$ 20) saltou de cinco em abril para 25 em agosto —mesmo assim, a receita ainda não cobre os custos fixos da casa. Hoje, ao menos 40% dos pedidos são feitos por Instagram e WhatsApp e podem ser retirados na loja ou entregues na casa de fregueses que ficam a menos de dez quarteirões dali.
Caso o movimento aumente, Valéria planeja terceirizar o atendimento das redes, mas não pensa em explorar novos canais tão cedo.
“Neste momento não preciso de mais do que isso. Está funcionando assim, é mais dinâmico. Existem outras redes que não acompanho, senão acabo me perdendo. É melhor fazer o que sei direito.”