A crise do coronavírus fez o Brasil fechar 1,198 milhão de postos de trabalho formais no primeiro semestre — pior resultado para o período desde 1992. Mas dados de junho indicam que o pior momento do mercado formal de trabalho parece ter ficado para trás.
Os números estão no Cadastro Geral de Empregados e Desempregados (Caged), divulgado na terça-feira pelo Ministério da Economia. O levantamento contempla apenas vagas com carteira assinada.
— É o maior número de fechamento de posições desde o início da série lá em 1992. E é natural que isso aconteça também. É a maior crise da História do país, com os respectivos impactos em termos de mercado de trabalho — disse o secretário de Trabalho, Bruno Dalcolmo
Apesar do recorde de demissões no acumulado do ano, os números de junho indicam recuperação. No mês passado, o saldo entre contratações e demissões ficou negativo em 10.984, queda de 96,8% em relação ao registrado em maio, quando as dispensas superaram as admissões em mais de 350 mil. Em abril, haviam sido 918 mil.
O resultado de junho veio melhor que o esperado pelo mercado, que chegou a prever perdas de mais de 200 mil vagas no mês — quase 20 vezes o resultado registrado. Em relação a maio, houve queda de 16% nas demissões, para 906 mil, e aumento de 24% nas contratações, que chegaram a mais de 895 mil.
Para Dalcolmo, os dados mensais indicam recuperação:
— Há uma curva de diminuição do número de demissões. Naturalmente, nenhuma demissão dá para comemorar, mas é um processo natural de saída de uma crise tão forte quanto foi essa.
Nesta terça-feira, o IBGE anunciou que a divulgação da Pnad Contínua, que também traz dados sobre o mercado informal de trabalho, teve que ser adiada por dificuldade na coleta. O resultado do segundo trimestre seria divulgado amanhã, mas foi adiado para 6 de agosto.
No Caged, o saldo negativo da primeira metade do ano foi formado principalmente entre março e abril, período mais crítico da crise do coronavírus. Esses dois meses respondem por cerca de 98% das perdas de vagas registradas em 2020.
Secretário vê melhora do mercado
Nos últimos meses, o governo e especialistas têm atribuído os resultados melhores que os esperados diante do tamanho da crise à medida provisória (MP) que autorizou acordos de redução de jornada e suspensão de contrato de trabalho.
— Isso aumentou o cardápio para as empresas conseguirem fazer um ajuste sem demitir — avalia Thiago Xavier, analista da Tendências Consultoria. — Fico preocupado quando essas políticas acabarem. Se a pandemia se estender, e as políticas de saúde não tiverem sucesso, a gente pode ter que refazer algumas políticas públicas. Há um risco sobre o que vem depois.
Desde abril, esses acordos já somam mais de 15 milhões. Em junho, o governo autorizou a prorrogação dos períodos de suspensão de contrato e jornada reduzida. Desde então, 1,5 milhão novas negociações foram firmadas.
— Não podemos comemorar a perda de um emprego sequer, no entanto, comemoramos sim a melhora da economia, a melhora do mercado de trabalho — avaliou o secretário especial de Previdência e Trabalho, Bruno Bianco, em coletiva de imprensa.
Um risco apontado por analistas, no entanto, é a possibilidade de que as demissões evitadas nesse período estejam represadas.
Se isso ocorrer, pode haver uma alta nas dispensas após o fim dos acordos, que preveem estabilidade de até oito meses para os trabalhadores afetados e podem ser firmados só até dezembro deste ano.
Perguntado sobre a possibilidade de alta do desemprego após um represamento de dispensas, Bianco descartou esse risco.
Para o secretário, a combinação entre medidas já adotadas e ações de geração de vagas que serão anunciadas pelo governo — como a redução de encargos trabalhistas — devem sustentar o mercado de trabalho no pós-pandemia.
— Nós não estamos parados. Ainda que estejamos dia e noite focados no benefício emergencial, estamos trabalhando com várias frentes. Uma frente trata de geração de emprego — afirmou Bianco.
Para Rodolpho Tobler, economista do Ibre/FGV, o sucesso dessas políticas deve decidir a continuidade do processo de retomada. Ele lembra ainda que os dados, embora positivos, refletem apenas o mercado formal, com negócios mais estruturados.
— É importante destacar que, na pandemia, o maior problema são as empresas informais, que estão mais desprotegidas, impedidas de trabalhar, e sofrem mais. As empresas formais, que acabam registrando seus funcionários, têm algum tipo de fôlego maior do que empresas muito dependentes da própria renda — explica o especialista.
Serviços são mais afetados
Considerando o levantamento por área da economia, o setor de serviços ainda é o que mais sofre os efeitos da pandemia. O segmento registrou perda de 44.891 postos de trabalho no mês passado.
Mesmo sendo o mais afetado pela crise, o setor também viu as demissões desacelerarem, já que, em maio, a diferença entre admissões e demissões havia ficado negativa em mais de 140 mil vagas.
Rodrigo Ribeiro, 29 anos, foi um dos trabalhadores que aproveitaram a melhora no setor de serviços. Após nove meses desempregado, em junho ele conseguiu uma vaga com carteira assinada na área de limpeza de uma empresa do ramo alimentício.
— Antes da pandemia, eu já tinha entregado muitos currículos. Mas com as medidas de isolamento e as empresas fechando, passei a ficar mais em casa, esperando que me chamassem. Acabei encontrando um anúncio de vaga na internet, fiz a entrevista por chamada de vídeo e, 15 dias depois, fui contratado.
No acumulado do ano, só a agricultura registra números positivos, com abertura de 62.633 vagas no período. Todos os outros setores da economia seguem com saldo negativo de postos de trabalho entre janeiro e junho,