Com o microempreendedorismo em alta no Brasil, é inevitável que em um dado momento o negócio precise de um reforço de capital para avançar. Mas esse passo, geralmente decisivo, esbarra na falta de preparo para lidar com o dinheiro emprestado, principalmente dos bancos.
Não foi o que aconteceu com Rosemary Miranda da Silva, 35 anos, e Sandra Margarete Pinheiro, 43 anos, que souberam planejar o empréstimo de microcrédito para alavancar suas atividades informais, ampliar sua renda e melhorar a condição econômica e social de suas famílias.
Rosemary passou por várias etapas até pegar um financiamento individual de R$ 17 mil no Santander para dobrar de 5 mil para 10 mil unidades mês a produção do "Atelier de Bolos, Doces e Salgados" que fundou há dez anos em uma das ruas mais movimentadas de Paraisópolis - a segunda maior favela da capital paulista, encravada ao lado do Morumbi, um dos bairros mais nobres da cidade de São Paulo.
"Primeiro, passei por um empréstimo coletivo, de R$ 8 mil, para quatro mulheres, com aval solidário. Com o dinheiro, comprei mesas, cadeiras, balcões para a loja. A experiência me deu segurança para assumir sozinha uma dívida de maior valor", conta Rosemary. Apontando para a agência do Santander, localizado em frente ao atelier, ela prevê para o próximo ano novas melhorias no negócio, com a fabricação de chocolates. Para isso, fará a "ousadia de tirar mais R$ 30 mil no banco", como ela mesma diz. "Agora não preciso mais dizer não para encomendas de última hora", salienta a empreendedora, que emprega duas pessoas e prefere manter os quatro filhos estudando e trabalhando longe de seu ganha pão. "Misturar as coisas não dá certo. E faz parte do meu sonho ver meus filhos na universidade."
Outro orgulho de Rosemary é ter vendido um bolo de milho para Sérgio Rial, presidente do Santander Brasil, quando o executivo visitou a favela.
Cinco em uma
Com Sandra Margarete Pinheiro não foi diferente. "Já tenho dez anos de microcrédito", ressalta. De um quiosque em Paraisópolis, ela passou para duas lojas na favela e está abrindo a terceira no Maranhão em sociedade com uma irmã. A "Sandra Lingerie" é uma espécie de cinco em uma, pois comercializa moda fitness, praia, lingerie, artigos de sex shop e beleza - neste último, uma das três filhas que trabalham com Sandra é consultora da Mary Kay.
"Para chegar até aqui, foram vários financiamentos. O primeiro, de R$ 1,8 mil, multipliquei com a compra de produtos. Depois os valores foram crescendo. Sempre usei o dinheiro no negócio: para ampliar a oferta de mercadorias, manter o estoque sempre com novidades", explica.
Para levar adiante o projeto da quarta loja, está pegando R$ 30 mil no Santander.
Um dos ingredientes da receita de sucesso de Sandra - que paga R$ 2,3 mil de aluguel em seu principal ponto de venda de 45 metros quadrados, em Paraisópolis - é o fato de continuar sacoleira até agora. "Sei que tenho crédito no banco, mas é preciso pagar em dia para continuar usufruindo disso e realizar a próxima etapa do meu projeto: ter uma loja em um shopping center que deve ser aberto aqui em breve", planeja.
Essas operações são sustentáveis economicamente porque os negócios financiados são sustentáveis, avalia o superintendente de microcrédito do Santander, Jeronimo Rafael Ramos. Segundo ele, dentre os fatores que fazem 95% dos tomadores de microcrédito pagarem em dia as parcelas estão as ações de educação financeira no modelo de atuação do banco para evitar o endividamento excessivo, o levantamento socioeconômico feito pelos agentes de crédito nos locais dos negócios, de palestras e orientação permanentes sobre questões básicas de administração, além de ajuda para formalização, quando o financiado solicitar. "Para continuar investimento neste programa de alto impacto social, há 15 anos passamos a ver o microcrédito como um negócio com sustentabilidade econômica", enfatiza o superintendente do Santander. De 2001 para cá, a instituição financeira liberou R$ 3,3 bilhões para cerca de 350 mil empreendedores, "ou em torno de 1,4 milhão de beneficiados".