Propostas em tramitação na Câmara, e disponíveis para consulta pública, dividem opiniões de especialistas no Direito da Família ao promover mudanças significativas no Estatuto da Criança e do Adolescente – ECA (Lei 8.069/1990). Enquanto uma pretende aumentar prazos para tentativas de reinserção de crianças acolhidas na família biológica, a outra possibilita o uso do nome afetivo de crianças e adolescentes nos cadastros de programas de adoção.
O Projeto de Lei 330/2018 possibilita a utilização do nome afetivo para crianças em processo de adoção. Conforme a justificativa, caso aprovada, “não será mais necessário esperar que o processo de adoção – sabidamente demorado – se complete para utilizar o nome dado pela nova família, como símbolo de uma vida nova que se inicia para a criança ou adolescente.”
A presidente da Comissão de Adoção do Instituto Brasileiro de Direito de Família – IBDFAM, Silvana do Monte Moreira, explica que o nome afetivo traz para a criança ou adolescente o sentimento de pertença. Segundo ela, ainda que o ECA determine um prazo de 120 dias com possibilidade de renovação por igual período uma única vez para os processos de adoção, o trâmite pode levar de quatro a oito anos.
“A criança fica, nesse interregno, numa espécie de limbo emocional, pois continua a carregar o peso do nome de quem a abandonou, negligenciou, abusou ou maltratou. O nome afetivo, além de suprir uma lacuna afetiva, libera as crianças e adolescentes do bullying na escola”, pontua a especialista.
Segundo ela, em uma primeira abordagem, os operadores do Direito usavam a lei do nome social como analogia para o nome afetivo. “Com base no artigo 227 da CRFB, precisamos ter o superior interesse da criança respeitado e atendido com prioridade absoluta. Leis sobre o nome afetivo já existem no RJ, proposta pelo Deputado Flavio Serafini, pioneira e seguida pelo MS e vários outros estados.”
Preconceito contra a adoção
O Projeto de Lei 8219/2014, atualmente em trâmite na Câmara dos Deputados, aumenta o prazo para tentativas de reinserção familiar da criança ou do adolescente. Conforme o texto, que teve origem no Senado, serão aumentados os prazos “para que a adoção de uma criança ou adolescente só seja concretizada depois de fracassadas todas as tentativas de reinserção familiar.”
Para a advogada, a proposta que “ressurgiu das cinzas”, é absolutamente contra o princípio da prioridade absoluta, pois não tem como foco os sujeitos de direitos, criança eadolescente. “Parece-me algo absolutamente contra legem e defasado, que trata crianças e adolescentes como objetos das famílias de origem. Não observa que a infância passa em um piscar de olhos e não pode ser desperdiçada no acolhimento, institucional ou familiar, enquanto se implora por cuidado dos que já demonstraram inaptidão para o exercício da parentalidade responsável.”
Ela reflete: “Percebo, ainda, um sério preconceito com a adoção e reputo isso a pouca valorização das varas da infância e da Juventude, vez que 6 anos depois de sua edição, o Provimento n. 36 do Conselho Nacional de Justiça – CNJ resta não cumprido pelos tribunais de justiça do Brasil. Crianças e adolescentes são invisíveis, não votam, não são economicamente ativos, o que os leva a desconsideração do Estado como sujeitos de direitos”.
Silvana frisa que o IBDFAM “não deixará que essa invisibilidade seja, praticamente, política de Estado que teima em desconsiderar que são apenas esses três sujeitos de direitos que gozam de prioridade absoluta: criança, adolescente e jovem.” Segundo ela, é preciso atentar para a obediência aos princípios da brevidade, excepcionalidade e respeito à condição peculiar de pessoa em desenvolvimento - obrigação do Estado, da família e da comunidade.
Para a especialista, o que falta no sistema de adoção brasileiro para facilitar o processo e atender o melhor interesse das crianças e adolescentes é cumprir o artigo 227 da Constituição Federal na íntegra, além de inserir o ECA como matéria obrigatória dos cursos de direito, psicologia e serviço social. “Falta respeito à criança e ao adolescente”, acrescenta.