A economia brasileira começa a esboçar uma trajetória de recuperação após despencar 4,1% em 2020 em meio à pandemia do coronavírus. É o que indicam os dados divulgados pelo IBGE nesta terça-feira, que mostram que o Produto Interno Bruto (PIB, conjunto de bens e serviços produzidos pelo país) avançou 1,2% no primeiro trimestre de 2021 em comparação com o quarto trimestre do ano passado.
O desempenho superou levemente as expectativas de mercado, que projetava alta de 1%, segundo a mediana das projeções de analistas ouvidos pela Reuters.
Com o resultado, o PIB voltou ao patamar do quarto trimestre de 2019, período pré-pandemia, mas ainda está 3,1% abaixo do pico da atividade econômica em 2014. Em relação ao primeiro trimestre de 2020, o crescimento foi de 1%.
— A gente conseguiu recuperar as quedas do (PIB) do primeiro e do segundo trimestres (do ano passado), quando houve o auge das restrições, mas temos que ver qual vai ser o ritmo de crescimento daqui pra frente. Isso vai ficar mais claro ao longo deste ano - disse Rebeca Palis, coordenadora de Contas Nacionais do IBGE.
A economia foi pouco impactada neste início de 2021 pelas medidas restritivas para conter a segunda onda de Covid, já que elas foram implementadas na segunda quinzena de março na maior parte das
Salto na agropecuária
Na comparação com o quarto trimestre do ano passado, houve taxas positivas na agropecuária (5,7%), indústria (0,7%) e serviços (0,4%).
Na agropecuária, a alta foi puxada pela melhora na produtividade e no desempenho de alguns produto, sobretudo a soja, que tem maior peso na lavoura brasileira e previsão de safra recorde este ano.
O novo ciclo de alta de commodities também ajuda a explicar a recuperação da atividade no período, especialmente entre setores exportadores.
Já na atividade industrial, o avanço veio das indústrias extrativas (3,2%) e da construção (2,1%). O único resultado negativo foi das indústrias de transformação (-0,5%), impactada pela indústria alimentícia.
No setor de serviços, o destaque foram as atividades financeiras, de seguros e serviços relacionados, que avançaram 5,1%:
— Na pandemia, a atividade econômica mais favorecida foi a financeira, por conta do aumento do crédito e também da poupança entre a população de mais alta renda, que conseguiu reduzir os gastos em razão do isolamento social — explicou Rebeca.
Maior taxa de investimento desde 2014
O pequeno avanço dos serviços em geral, porém, é um sinal de alerta, pois reúne segmentos que são mais impactados por normas de isolamento social, mais suscetíveis a uma possível terceira onda de Covid-19. Serviços representam cerca de 70% do PIB.
Sob a ótica da demanda, os investimentos se destacaram. Avançaram 4,6% em relação ao quarto trimestre de 2020, elevando a taxa de investimentos a 19,4% do PIB, a maior desde 2014.
O investimento foi puxado pelo aumento na produção de bens de capital (máquinas e equipamentos), pelo desenvolvimento de softwares e pela construção.
Segundo o IBGE, os números tiveram impacto também do Repetro, regime aduaneiro especial que permite ao setor de petróleo e gás adquirir bens de capital sem pagar tributos federais.
Impacto da inflação sobre o consumo
Já o consumo das famílias registrou queda de 0,1%. Foi o único componente do PIB, ao lado dos gastos do governo, a ficar no terreno negativo.
- O aumento da inflação pesou, principalmente, no consumo de alimentos ao longo desse período. O mercado de trabalho desaquecido também. Houve ainda redução significativa nos pagamentos dos programas do governo às famílias, como o auxílio emergencial - disse Rebeca.
No setor externo, as exportações de bens e serviços tiveram crescimento de 3,7%, enquanto as importações de bens e serviços cresceram 11,6% em relação ao quarto trimestre de 2020.
Sinal de recuperação
Mesmo diante das incertezas, o resultado do primeiro trimestre pode ser considerado o pontapé inicial para a saída do tombo causado pelo pandemia de Covid-19, que fez o país enfrentar em 2020 a pior recessão econômica em 120 anos.
Analistas avaliam que o impacto da segunda onda sobre a atividade econômica, a partir de abril, foi menor do que o esperado inicialmente. Não por acaso publicações do boletim Focus, do Banco Central, passaram a apontar números mais otimistas para o crescimento do PIB este ano.
O mais recente, publicado na última segunda-feira, indicou que analistas do mercado esperam crescimento de 3,96% em 2021.
Mas ainda há cautela com alguns fatores. Segmentos da indústria não ligados ao mercado internacional já zeraram seus ganhos nas últimas divulgações setoriais do IBGE. E serviços e comércio permanecem abaixo do patamar pré-pandemia.
Falta de insumos e crise hídrica
Problemas como a falta de insumos, o aumento do preço das matérias-primas e o agravamento da pandemia dificultam a recuperação mais consistente desses setores.
O avanço da vacinação pode acelerar a recuperação da economia. No entanto, o risco de uma terceira onda, em meio ao desemprego recorde que dificulta o consumo, coloca em dúvida a velocidade de recuperação da atividade nos próximos meses.
Nos últimos dias, a crise hídrica também entrou no radar dos economistas. A escassez de energia deve elevar as tarifas, pressionando o custo de produção e a inflação.