Com a pressão inflacionária e o aumento dos juros, que afetam o poder de compra da população, a CNC (Confederação Nacional do Comércio de Bens, Serviços e Turismo) decidiu reduzir a projeção de contratações temporárias para o Natal deste ano.
A nova previsão indica abertura de 89,4 mil vagas. Na prática, representa um corte de quase 5.000 postos frente à estimativa anterior para 2021, feita no último mês de setembro. À época, a CNC havia estimado abertura de 94,2 mil contratações temporárias neste ano. Seria o maior nível em oito anos —ou seja, desde 2013.
A nova previsão continua acima do número do ano passado (68,3 mil), mas está 2,2 mil abaixo do resultado de 2019 (91,6 mil), antes da pandemia.
"Em uma situação de normalidade de consumo, o varejo teria condições de gerar mais contratações temporárias do que o previsto agora. Esse é o ponto", afirma o economista da CNC Fabio Bentes.
"Os juros estão mais altos para o consumidor, a inflação está em dois dígitos. Diante dessas condições, a revisão teve de ser feita."
Segundo a CNC, o Natal de 2021 deve movimentar R$ 57,48 bilhões em vendas. Com o desconto da inflação, a projeção sinaliza queda de 2,6% em relação a 2020, o segundo ano consecutivo de recuo. Em setembro, a entidade esperava alta de 3,8%, em termos reais, em 2021.
Mesmo diante da piora na economia, após um PIB (Produto Interno Bruto) menor do que o esperado, o setor de terceirizados e temporários prefere falar em "otimismo cauteloso", e não fará projeção menor de vagas para o trimestre de outubro, novembro e dezembro, que envolve as contratações para o Natal.
Segundo a Asserttem (Associação Brasileira do Trabalho Temporário), os 565 mil postos previstos anteriormente se mantêm. "É um otimismo cauteloso. Nós não fizemos nenhum exagero em nossas previsões para não sermos pegos de surpresa", afirma Marcos de Abreu , presidente da associação.
Ele diz ainda que, se um setor não contrata, outro pode ter bom desempenho, como é o caso da indústria de alimentos, que não abre vagas em dezembro, mas que está com contratações encaminhadas neste mês. "A indústria alimentícia, que não contratava em dezembro, foi pega de surpresa, com crescimento exagerado da área de serviços, principalmente serviços para pessoa física, que envolve academia, turismo e bares e restaurantes", diz.
O setor alimentício aquecido é o que garantiu a vaga temporária de fim de ano para o jovem Nathan de Vincenzo Nascimento, 21 anos, que está atuando como promopadeiro. Sua função é fazer panetones na rede de supermercados Sonda, onde visita uma loja a cada dia.
O profissional conta que estava na área de panificação na pandemia, mas sem carteira assinada. Agora, com o emprego temporário formal, tem expectativa de conseguir ser efetivado em 2022. "Eu acho que esse emprego pode abrir as portas, porque eles me contratam para fazer o panetone, mas já comecei a mexer com outras coisas", conta.
Cris Mahara, gerente de serviços de RH da Employer, diz que a taxa de efetivação nos empregos temporários é de 22%, indicando que, a cada três temporários, um é efetivado. Segundo ela, mesmo com a insegurança em relação à economia e à nova cepa da Covid, a ômicron, há setores que, de fato, seguem mais aquecidos, como o comércio online.
"O ecommerce continua em alta, o que desencadeia aumento nas contratações na área de logística, na adminstrativo-financeira e em todas relacionadas às compras online e ao processo envolvido. O ano passado foi um ano diferente para o setor do comércio, mas tivemos aumentos expressivos na indústria", diz.
Segundo ela, deve haver elevação de 20% nas vagas temporárias de fim de ano em 2021 ante 2020, com 500 mil postos abertos. "É um bom momento para quem está precisando de emprego. O trabalho temporário é uma alternativa e uma oportunidade de conseguir efetivação."
COMÉRCIO DE RUA E DE SHOPPINGS AINDA CONTRATAM
Mesmo com as dificuldades atuais envolvendo economia, pandemia e incertezas, Ricardo Patah, presidente do Sindicato dos Comerciários da capital paulista e da UGT (União Geral dos Trabalhadores), diz que o fim de ano é, tradicionalmente, um momento de alta das vendas e de recuperação do comércio, que segue com vagas abertas.
Ele afirma que manter o otimismo diante do cenário econômico ruim é uma forma de fazer com que os empresários contratem, os trabalhadores encontrem oportunidades e a setor tenha nem que seja uma mínima movimentação positiva diante de tantas dificuldades na pandemia.
"Primeiro, tem uma característica muito interessante do comércio que independe dos históricos de complexidade econômica. É que o comerciante, de uma forma geral, acredita muito no mês de dezembro, quando consegue vendas de duas e vezes e meia a três vezes acima da média do ano."
Desde o início da crise, o sindicato tem feito mutirões de vagas e contratações. Na pandemia, o mutirão passou a ser online e ainda oferece, neste mês, 5.000 postos de trabalho entre temporários e fixos.
"É um momento de oportunidades em shoppings e lojas de rua. Há vagas na periferia e em grandes redes, é importante saber que há vagas", afirma.
A assistente social Jéssica Dias Oliveira, 32, agarrou a chance. A partir desta segunda-feira (13), ela começa a trabalhar todos os dias e vai assim até o Natal. O emprego surgiu na loja de artesanatos em que ela já estava, de forma temporária, reforçando o atendimento de final de semana.
"Eu estava trabalhando toda sexta, sábado e domingo, mas, a partir da próxima semana até o dia 24, vou trabalhar todos os dias." A profissional comemora a ampliação dos dias de trabalho porque, desde o início da pandemia, tem tido dificuldades para conseguir renda. "Vai dar para eu me planejar para dar os primeiros passos para o ano que vem e poder saber que vou passar uma ceia de Natal boa com minha família."
Luís Augusto Ildefonso, diretor institucional da Alshop (Associação Brasileira de Lojistas de Shopping), afirma que a associação também não fará previsão para menos no que diz respeito às vagas temporárias. Embora as questões econômicas preocupem, a demanda reprimida deve fazer com que as vendas em shoppings tenham recuperação, segundo ele, mantendo a necessidade de contratações neste fim de ano.
"Há uma demanda reprimida, pois tem muita gente com a necessidade de comprar alguma coisa. Outro fator positivo foi a liberação do fluxo de pessoas e a aceleração da vacina, que trouxe uma confiança maior para consumidores empresários, tudo isso alimenta uma contração de temporários bem melhor do que foi no ano passado."