Há 20 anos o brasileiro convive com uma tabela de cobrança do Imposto de Renda (IR) desatualizada e que traz prejuízos perversos aos contribuintes, especialmente aos mais pobres. De 1996 até o ano passado, a falta de correção dos índices e reajustes abaixo da inflação têm representado uma defasagem acumulada de 83%.
Isso significa que o ritmo de correção do quanto o cidadão tem que pagar de imposto em relação ao seu rendimento não acompanha a inflação registrada há duas décadas, que se mostra crescer em uma velocidade bem superior. Ou seja, a inflação subiu, pressionou o poder de compra da população, e independentemente se a pessoa teve ou não aumento de salário foi pagando mais imposto ano após ano.
Aliás, é por esse motivo que tem aumentado a pressão sobre o governo federal. Desta vez, a cobrança para atualização desses números vem da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), que enviou na última semana um ofício ao presidente Michel Temer cobrando uma atitude que ponha fim a essa penalização ao contribuinte.
Para se ter uma ideia, pela tabela atual do IR, está isento de acertar as contas com o Leão quem tem renda mensal de até R$ 1.903,98. O valor é muito abaixo da quantia que deveria ser hoje se o governo tivesse atualizado a tabela nos últimos anos. Pelos cálculos do Sindicato Nacional dos Auditores Fiscais da Receita Federal (Sindifisco Nacional), somente deveria pagar o Imposto de Renda quem ganha mais de R$ 3.454,65 por mês.
“Essa defasagem representa um ataque à grande massa de trabalhadores do país, à medida que, ao não corrigir a tabela, o governo acaba arrecadando de quem não deveria”, critica o presidente do Sindifisco Nacional, Cláudio Damasceno.
O presidente nacional da OAB, Claudio Lamachia, reforça o coro e frisa que é “absolutamente inaceitável” o país conviver com uma elevada carga tributária e ainda impor contribuições mais altas, principalmente aos que ganham menos.
No documento enviado à Presidência, a Ordem – que aguarda julgamento de duas ações no STF à respeito do tema – aponta que a atualização inferior à inflação “ofende comandos constitucionais, como conceito de renda, capacidade contributiva e não confisco tributário”. E ainda diz que o reajuste adequado pode representar benefícios à desoneração da folha de pagamento e estimular a economia e o mercado consumidor interno.
Damasceno pondera que ao não corrigir a tabela do IR, o governo se apropria de receitas que não deveriam ser pagas. “Isso faz com que aqueles recursos, por menores que sejam, e que poderiam ser usados por contribuintes para outras necessidades, como compra de remédios, sejam retidos pela União”.
Mesmo diante desse quadro, não há sinalização por parte do governo de uma atualização significativa da tabela. Procurada por A GAZETA, a Presidência da República confirmou apenas que recebeu o ofício da OAB, mas disse que não iria se manifestar sobre o tema.
Por enquanto, sobre o assunto, o que se sabe é que no orçamento deste ano, o governo prevê uma correção de 5%, valor esse que pode ser mudado e que, de qualquer forma, só valerá para a declaração de 2018. “Esse debate é sempre muito complicado e já passou pelos governos FHC, Lula, Dilma e agora Temer. E todos eles negam a atualização sob o argumento de que o país não pode abrir mão da arrecadação”, lamenta Damasceno.