Membros do governo dizem que foi equivocado o plano de tentar aprovar, em uma única proposta, novos programas trabalhistas e mudanças na CLT (Consolidação das Leis do Trabalho).
A proposta deveria ter focado apenas na possibilidade de criação de novas modalidades de contratos de trabalho. O pacote de medidas passou a ser chamado de minirreforma trabalhista e foi derrubado pelo Senado na quarta-feira (1º).
Agora o governo quer rever a estratégia e, em um segundo momento, buscar espaço para tentar emplacar medidas com potencial de impulsionar contratações de jovens e informais —sem misturar o debate com as alterações de normas da CLT.
A junção dos dois temas, segundo articuladores políticos do Palácio do Planalto, elevou a resistência ao pacote no Senado, que já havia rejeitado em 2020 outro pacote na área trabalhista.
A auxiliares o ministro Paulo Guedes (Economia) e integrantes da pasta do Trabalho e da Previdência, sob comando de Onyx Lorenzoni, mostraram descontentamento com a decisão de apresentar ao Congresso um projeto tão amplo.
A proposta da minirreforma trabalhista foi costurada pela extinta Secretaria Especial de Previdência e Trabalho do Ministério da Economia, que era comandada por Bruno Bianco. Hoje ele é ministro da AGU (Advocacia-Geral da União).
A secretaria especial se transformou no Ministério do Trabalho e da Previdência. A mudança fez parte de uma reestruturação das pastas para abrir mais espaço na Esplanada para o centrão, grupo de partidos que se alinhou ao governo após a liberação de cargos e emendas.
O clima político acirrado e a atuação de entidades do Sistema S contra a proposta são apontados como fatores que culminaram na derrota dos planos de Guedes e Onyx, segundo membros desses ministérios.
No projeto que foi à votação na quarta, o Sistema S perderia arrecadação. Esse seria uma das formas de bancar parte dos custos de contratação de jovens.
O presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), usou o Twitter para criticar o Sistema S. "Hoje, três milhões de jovens continuarão a dormir desempregados. Foram vencidos por instituições que supostamente deveriam defender o trabalho para todos", escreveu.
"Todo mundo fez sacrifício na pandemia. O Sistema S não. E, infelizmente, parte do Senado não enxergou", afirmou. Foi na Câmara que a MP cresceu e ganhou novos dispositivos.
Integrantes do governo querem insistir em uma agenda de programas trabalhistas a serem encampados por Onyx, recém-nomeado para o cargo. Ele é próximo do pesidente Jair Bolsonaro (sem partido).
Uma remodelagem dos programas, principalmente em relação ao financiamento dos gastos, será avaliada.
O Senado já barrou dois pacotes trabalhistas desde o início do governo Bolsonaro. Em abril do ano passado, a Casa derrubou a MP que criava a carteira Verde e Amarela, promessa de Guedes apresentada na campanha de Bolsonaro ao Planalto.
Esse programa previa redução de encargos, como contribuição previdenciária, a empresas que contratarem jovens de 18 a 29 anos em primeiro emprego.
A proposta também permitia corte temporário no recolhimento para o FGTS (Fundo de Garantia do Tempo de Serviço), ou seja, menos dinheiro para o trabalhador.
O governo afirma que, com a redução de encargos, mais empregos serão gerados. Mas a oposição diz que esse tipo de medida precariza o trabalho e reduz direitos do empregado.
A equipe econômica esperava criar 1,8 milhão de vagas formais até 2022 com essa medida a carteira Verde e Amarela.
Na mesma MP, Bolsonaro havia proposto mudanças na CLT, como flexibilização da fiscalização trabalhista. Isso foi retomado no texto derrubado na quarta pelo Senado.
Já em 2021, o plano de criar um novo programa trabalhista voltou. Guedes anunciou, em abril, que iria propor uma medida para estimular o emprego para jovens e informais —parte da agenda de retomada econômica após arrefecimento da pandemia.
Foram apresentadas ao Congresso três novas modalidades.
Um dos programas trabalhistas que faziam parte do pacote era o Requip (regime de qualificação profissional). A medida era voltada para jovens, desempregados e pessoas carentes.
O plano previa a criação de bônus (bolsa) de até R$ 550 por mês pago ao trabalhador em treinamento. O contrato estaria vinculado a um curso de qualificação profissional. Após um ano, o trabalhador teria direito a um recesso remunerado de 30 dias. Mas sem previsão de 13º pagamento da bolsa nem de FGTS.
Outro tipo de contratação que estava previsto foi pedido por Onyx, chamado de Programa Nacional Prestação de Serviço Social Voluntário. Ele permitiria que prefeituras contratassem temporariamente pessoas para serviços.
Dos três programas do projeto aprovado, o único que previa vínculo empregatício era o Priore (Programa Primeira Oportunidade e Reinserção no Emprego). Férias e 13º estariam garantidos.
No entanto, nesse tipo de programa, haveria uma redução do recolhimento para o FGTS dos empregados, ideia semelhante à carteira Verde e Amarela.
Segundo Onyx, os programas poderiam gerar 3 milhões de novas vagas. No entanto, nem todos esses contratos seriam contabilizados como emprego formal.
O principal argumento apresentado por senadores na sessão de quarta para derrubar a proposta de minirreforma trabalhista foi que o plano não foi debatido e não haveria garantias de que a Câmara aceitaria a desidratação do texto.
Inicialmente a versão enviada pelo governo, em abril, tinha 25 artigos. Foi editada uma MP para prorrogar o programa emergencial de corte de jornada e de salários de trabalhadores da iniciativa privada.
A equipe econômica e aliados do governo aproveitaram a tramitação acelerada da proposta e incluíram o pacote trabalhista. Com isso, a versão aprovada pela Câmara tinha quase cem artigos.
O Senado também foi a principal barreira para que Guedes alterasse regras do abono salarial.
Esse benefício pode chegar a um salário mínimo (R$ 1.100) e é pago pelo governo a trabalhadores com carteira assinada e com renda mensal de até dois salários mínimos (R$ 2.200).
Na reforma da Previdência, os deputados, por maioria, aceitaram que o abono salarial fosse pago a trabalhadores formais com renda de até cerca de R$ 1.500 por mês. Assim, menos pessoas receberiam o benefício.
O Senado, porém, derrubou todas as mudanças nas regras do benefício.
O corte no abono salarial voltou a ser estudado pela equipe de Guedes no ano passado como forma de bancar a ampliação do Bolsa Família, criando um programa social com a marca de Bolsonaro.
Sem apoio político no Congresso e do próprio presidente, a ideia não avançou.