Os funcionários que se negam a usar máscara no ambiente de trabalho podem sofrer punições ou até ser demitidos, segundo advogados especializados em direito do trabalho.
Veja abaixo o tira-dúvidas com Flavio Aldred Ramacciotti, sócio da área trabalhista de Chediak Advogados; Bianca Canzi, advogada trabalhista do escritório Aith, Badari e Luchin Advogados; Fernando de Almeida Prado, advogado, professor e sócio do BFAP Advogados, e André Leonardo Couto, da ALC Advogados.
Um empregado pode ser demitido se deixar de usar máscara? Cabe demissão por justa causa?
Bianca Canzi: Empresas podem demitir profissionais que não cumprem exigências de segurança. Em alguns casos, pode até ser por justa causa se comprovado que a regra era clara, o profissional estava ciente e que gerou prejuízos para a organização.
Fernando de Almeida Prado: Caso insista em não usar máscara, ele pode ser demitido, inclusive, por justa causa, caso esteja previsto nas regras da empresa. Mas tem que ser um não uso reiterado. Não pode simplesmente pegar um dia sem o funcionário usar máscara e desligá-lo imediatamente por isso. Se o funcionário não usar uma máscara, antes ele deve ser advertido e suspenso. Uma das hipóteses de justa causa previstas na CLT é a indisciplina, que é considerada quando um empregado deixa de cumprir uma regra da empresa.
Flavio Aldred Ramacciotti: Sim. Se, após ser advertido, o empregado continuar com a postura faltosa, ou seja, continuar reiterando a falta, ele poderá ser suspenso e demitido por justa causa. Segundo a CLT, o reiterado e injustificado descumprimento de uma determinação do empregador pode ocasionar a dispensa por justa causa por indisciplina ou insubordinação.
André Leonardo Couto: o regulamento da empresa nessa situação de pandemia deve ser respeitado. Se o regulamento da empresa prevê que todos os funcionários devem usar máscaras, caso o empregado seja encontrado sem usar máscara, sugiro primeiro a aplicação de uma pena de advertência e observada a gradação das penas (novas advertências e/ou suspensões ao trabalho), para tão somente, ao final, caso ele ainda persista em não continuar usando a mascará ser dispensado por justa causa.
A empresa precisa deixar claro que os funcionários devem usar as máscaras no local de trabalho?
Bianca Canzi: É obrigação do empregador deixar todas as regras claras e garantir a segurança dos trabalhadores em relação ao risco de contágio por Covid-19. A máscara tem sido considerada pela Justiça como um equipamento de proteção obrigatório, que deve ser fornecida pelo empregador. A empresa deve fornecer ainda todos os equipamentos de proteção individual e coletiva como álcool em gel, além de exigir o distanciamento social e manter o ambiente limpo e saudável para o trabalhador.
Fernando de Almeida Prado: A empresa precisa deixar claro que os funcionários devem usar a máscara, especialmente para validar uma eventual justa causa de algum funcionário por força da recusa do uso.
Flavio Aldred Ramacciotti: É uma questão de bom senso, mas aconselho que a empresa deixe isso expresso, por meio de treinamentos e cartazes, até para demonstrar e comprovar que a empresa tem adotado medidas para a prevenção do coronavírus.
A empresa deve abrir exceção sobre o uso de máscaras para os momentos como café e refeições? Nesse caso, deve haver um local reservado para esses intervalos?
Flavio Aldred Ramacciotti: A empresa deve tomar medidas que evitem aglomerações mesmo nesses momentos, como flexibilizar horários, disponibilizar mais máquinas de café e bebedouros e impossibilitar o uso de cadeiras próximas nos refeitórios.
Bianca Canzi: Sim. Porém deve ter um local adequado, bem como uma escala de horários, para que não haja o risco de contaminação entre os funcionários.
Fernando de Almeida Prado: Não, porque, dependendo do tamanho da empresa e de suas atividades, ela sequer tem um local destinado a café e refeições. É muito comum que os escritórios tenham uma copa reservada, pequena, só para tomar café e não é permitido o consumo de refeições no local. Em prol da segurança e da saúde dos demais, o funcionário que tiver interesse de tomar o café ou comer alguma coisa poderia ir para outro local e não fazer isso no trabalho.
É permitido que as empresas não liberem e não autorizem, mesmo que para fins de refeição. Exceto, logicamente, se por alguma situação específica da empresa, a refeição tiver que ser realizada no local de trabalho. Isso é muito comum nas indústrias, que às vezes são afastadas dos centros urbanos e possuem um refeitório no local. Então, o refeitório tem que atender aos protocolos relacionados à Covid-19 e a refeição vai ser realizada sem o uso de máscara.
André Leonardo Couto: As organizações devem evitar aglomerações, com ações pontuais para manter o distanciamento entre as pessoas. Entre elas estão manter distanciamento entre as mesas, uso de máscara quando o empregado estiver fora da mesa ou se locomovendo e o rodízio dos empregados em locais como copas e áreas de descanso.
Caso o funcionário contraia Covid-19, mesmo usando máscara o tempo todo, ele pode justificar que foi infectado porque a empresa deixou de cumprir as regras de prevenção e higiene?
Bianca Canzi: O Supremo Tribunal Federal (STF) reconheceu que a contaminação por Covid-19 se caracteriza como acidente de trabalho e, com isso, as empresas devem redobrar os cuidados para evitar a contaminação. Para configurar um acidente do trabalho, o trabalhador terá que provar que a empresa não cumpria com as regras de prevenção e higiene.
Flavio Aldred Ramacciotti: Entendo ser muito difícil a prova de que a Covid-19 foi contraída no trabalho (exceto para os casos de trabalho em locais de muito risco, como hospitais), pois o contágio pode ter acontecido em qualquer lugar. Por esse motivo, é importante que a empresa tenha provas de que adotou todas as medidas para evitar o contágio de seus empregados.
André Leonardo Couto: Caso o funcionário seja acometido pela Covid-19 dentro de seu ambiente de trabalho, por falta de higienização correta da empresa, ele poderá recorrer ao Judiciário. O STF já reconheceu a Covid-19 como sendo doença ocupacional. Assim, se presume para determinadas atividades, como área médica, que o profissional da saúde adquiriu a Covid-19 no trabalho. Desta forma, se há elementos que faça presumir que a doença foi adquirida no trabalho e caso a empresa se recuse em emitir o Comunicação de Acidente do Trabalho (CAT), o empregado pode procurar o sindicato da categoria ou o médico que o assistiu e comunicar a doença ocupacional à Previdência Social. Se há elementos relacionando a doença ao trabalho, ele poderá recorrer ao Judiciário para pedir as indenizações pertinentes.