O crediário do cartão de crédito, uma nova forma de parcelamento de compras que pretende mudar o tradicional 10 vezes sem juros do país, será lançado oficialmente nesta quarta-feira (27).
Bancos fazem os últimos ajustes para oferecer a linha, com a expectativa de que a oferta do produto comece a ocorrer em abril.
A nova linha de crediário, via cartão de crédito, era a única medida entre as 21 listadas pela Febraban (associação de bancos), em campanha lançada em 2018, como algo que deveria ser feito pelos bancos para reduzir as altas taxas de juros.
O novo produto será oferecido como uma alternativa —com juros— para compras parceladas, e o primeiro alvo serão as lojas que não oferecem a clientes opções de parcelamento.
Para convencer os varejistas de que a linha é vantajosa, bancos deverão fazer o pagamento ao comércio em até cinco dias —o prazo final dependerá de cada bandeira, segundo a Abecs (associação da indústria de cartões).
Essa era uma das principais reivindicações do comércio, que reclama do longo prazo de recebimento.
Atualmente, vendas no cartão, sejam à vista, sejam parceladas, são pagas em 30 dias para o lojista. Cada parcela aguarda mais 30 dias para chegar ao lojista, seguindo o fluxo de pagamento de fatura do cliente. Se ele quiser receber antes, o custo é maior.
"O crédito para o lojista tem que ser: se vendeu, tem que receber o dinheiro dele", defende Octavio de Lazari, presidente do Bradesco.
Ele diz que o banco já oferece o produto a alguns clientes, com parcelamento de até 24 meses e taxas de juros baixas.
A Folha procurou as principais instituições para detalhar o produto —quem se manifestou pediu que a reportagem procurasse a Abecs, que coordena o lançamento oficial. A exceção foi o Nubank, que afirmou não ter planos de lançar o crediário.
No projeto, a principal atuação da Abecs foi uniformizar como serão feitas as simulações de juros, taxas e custo da nova linha.
Essa nova linha é uma frente de uma batalha dos grandes bancos para acabar com o que chamam de distorção do país com o amplo uso do parcelamento sem juros.
Segundo Boanerges Ramos Freire, presidente da Boanerges&Cia, consultoria em varejo financeiro, 55% de todas as operações com cartão de crédito são na modalidade de parcelamento sem juros.
O lojista decide vender a prazo e espera para receber os recursos. Não corre, porém, o risco de calote do comprador, que fica com o emissor do cartão de crédito.
Boanerges diz, ainda, que cerca de 25% das operações com cartão de crédito --à vista ou parceladas-- são antecipadas pelos lojistas, com juros.
"Não faz nenhum sentido pagar à vista ou pagar em 10 vezes e ter o mesmo preço. Alguém está pagando esse custo, e quem está pagando é o consumidor. Se ele quer comprar à vista, vai comprar à vista e não vai pagar juros e vai pagar um preço mais barato na mercadoria", afirma Lazari.
Desde que começaram a falar sobre o produto, os bancos indicaram que cobrariam taxas competitivas nessa linha, uma estratégia para não assustar consumidores acostumados a pagar as compras sem juros.
Chegou-se a sugerir taxas parecidas com as do crédito consignado, que tem desconto em salário, uma das mais baixas do mercado.
Executivos do setor dizem não ver uma corrida por juros de 1% a 2% ao mês.
"A primeira barreira para o crediário é que ele é com juros. Mesmo que sejam relativamente baixos, têm que compensar o risco [de calote] e remunerar o capital do banco", diz Boanerges.
Isso somado à resistência do consumidor em pagar juros que estejam explícitos na operação de crédito, o que explica o sucesso do parcelamento sem juros no Brasil, apesar do custo embutido.
"O brasileiro prefere se enganar a pagar conscientemente juros", afirma Boanerges.
Para funcionar o novo sistema, o varejo precisaria adotar preços diferentes por forma de pagamento, algo que passou a ser permitido por lei no fim de 2016, mas que, na prática, não pegou.
Para Boanerges, é complexo para o comércio anunciar diversas formas de pagamento.
O desconto à vista, diz ele, deve seguir restrito à decisão do dono da loja, na hora da negociação com o cliente.
Representantes da FecomercioSP e da Associação Comercial de São Paulo mostram ceticismo com o produto, mas dizem que alternativas de pagamento são bem-vindas.