No ano marcado pela pandemia, 5,8 milhões de novos consumidores chegaram ao comércio eletrônico no Brasil só no terceiro trimestre de 2020. O faturamento do setor entre janeiro e novembro cresceu quase 70% em relação a 2019, de acordo com a ABComm (Associação Brasileira de Comércio Eletrônico).
Para muitos empresários, porém, esse foi um movimento complexo: o trabalho de reforçar a operação online se sobrepôs à volta do movimento presencial, com a necessidade de se adaptar a um consumidor que busca rapidez e está conectado à internet.
“Todo mundo retomou as atividades em loja considerando esse legado, equilibrando as duas frentes. Mas, a partir de agora, o empresário deve perseguir a omnicanalidade, que é a fusão absoluta dos canais de atendimento. O cliente não é cliente de um canal, é cliente da marca”, diz Enio Pinto, gerente de relacionamento com o cliente do Sebrae.
Nos últimos meses, o empresário Felipe Gonçalves, 29, dono de três lojas da franquia Anjos Colchões & Sofás em São Paulo e no Mato Grosso do Sul, dedicou-se a essa transição. Se antes da pandemia os negócios tinham pouca atuação virtual, hoje 80% das vendas são realizadas ou fechadas com ajuda de plataformas digitais.
Para chegar a essa porcentagem, o empresário começou a debater em maio com os funcionários a forma de usar Instagram, Facebook e WhatsApp como ferramentas de vendas quando as lojas tiveram de ser fechadas por causa da Covid-19. “Para nós foi uma novidade, porque o consumidor estava acostumado a ir à loja experimentar o colchão. Com o presencial vetado, utilizamos a tecnologia para chegar até o cliente”, diz Felipe.
Com um smartphone em mãos, os vendedores passaram a enviar fotos para apresentar o mostruário de tecidos dos colchões, a gravar áudios curtos e a fazer chamadas de vídeo para entender a necessidade, recomendar produtos e responder dúvidas. Com a reabertura do comércio, a mesma equipe agora atende nas duas frentes, já que muitos compradores começam o contato de forma online e terminam o negócio na loja.
Para contrabalançar físico e digital, os atendentes se ocupam das redes sociais e WhatsApp sempre que não há clientes na loja —de forma que compradores digitais não esperem muito.Além disso, um funcionário do departamento administrativo foi destacado para entrar nas páginas de Instagram e Facebook da marca e verificar se há comentários sem resposta.
“Se temos agilidade e flexibilidade, deixamos o cliente confortável e ele consegue sentir segurança no atendimento, dentro da loja ou fora. Quando a equipe sentiu o faturamento crescer, comprou esse modelo”, diz Felipe Gonçalves, da Anjos Colchões & Sofás.
A necessidade de digitalização seguirá presente para o pequeno varejista, mas a conexão humana com o consumidor também ganha espaço no físico depois da Covid-19, desde que em ambiente seguro, afirma Marilia Borges, analista sênior de varejo da Euromonitor, empresa que realiza pesquisas de mercado.
O contato pessoal com o consumidor e a possibilidade de tirar dúvidas são uma grande vantagem competitiva do pequeno, mas é preciso garantir que o cliente tenha a mesma experiência em todos os canais de atendimento, diz Fernanda Bromfman, gerente de varejo para pequenas e médias empresas do Google.
“O mesmo cuidado que você sente na loja física precisa ser transmitido também na mensagem online”,afirma Bromfman.
No caso da Mesa 3, rotisseria com loja e fábrica em São Paulo, a linguagem visual passa por esse processo. “Ela é estrutural para a gente conseguir traduzir o trabalho manual que fazemos. Tudo passa por isso: fotos, embalagens, site e Instagram. É uma voz que se multiplica por diversas frentes”, diz Valentina Soares, responsável pela comunicação visual da empresa.
Com a chegada da pandemia, a marca acelerou o lançamento de seu ecommerce e intensificou o trabalho nas redes sociais e WhatsApp. Essas ferramentas digitais, além de segurarem o faturamento na quarentena, trouxeram uma nova dinâmica ao negócio.
“Com a baixa demanda física, funcionários fazem também o atendimento do site. Mas a gente sente que está apertado para a equipe. Estamos estudando uma alternativa”, diz.
Para Enio Pinto, do Sebrae, à medida que um pequeno negócio começa a se expandir, ele deve procurar soluções que ajudem na automação de processos.
Uma dessas ferramentas é o CRM (Gestão de Relacionamento com o Cliente, em português), sistema que armazena o histórico do cliente com a marca e auxilia nas vendas digitais ativas em maior escala, de forma personalizada.
“Por exemplo, se você é dentista, o CRM vai enviar um email ao paciente lembrando que já faz um ano que ele fez a última visita”, diz. O sistema pode custar a partir de R$ 50 ao mês, a depender da funcionalidade.
“Depois da pandemia, muitas empresas que já tinham uma presença digital vão sentir a necessidade de profissionalizar cada vez mais essa atuação”, afirma.